SOBRE LULA E A LAVA-JATO
OPINIÃO - Por Jean Wyllis - Em
tempos de polarização política, quando tudo é discutido em clima de torcida,
sem nuances, é muito difícil se pronunciar sobre o que é complexo de forma
complexa, sendo sincero e agindo com honestidade intelectual, porque o que boa
parte do público espera e quer é um posicionamento enviesado pela adesão cega
ou a rejeição raivosa. "Lula, guerreiro do povo brasileiro" ou
"Um, dois, três, Lula no xadrez". "Fora, Dilma" ou
"Não vai ter golpe". Mas as palavras de ordem pouco dizem sobre os
fatos, pouco ajudam a entendê-los.
Eu não
fiquei feliz com o que aconteceu hoje. Não mesmo. Sou consciente de que a
imagem do Lula sendo conduzido à sede da Polícia Federal é um golpe duro para
uma história de luta, para os sonhos e as utopias de muita gente, e será usado
(e já é festejado) por aqueles que sempre ganharam às custas do sofrimento dos
mais pobres, por aqueles que acham insuficiente a rendição do PT e as políticas
de ajuste da presidenta, e querem mais, ainda mais. Contudo, essa imagem é o
resultado de uma política que é responsabilidade do Partido dos Trabalhadores.
A corrupção não começou com o PT e não se esgota nele (embora o vazamento
seletivo de informações e a clara tendenciosidade de parte do judiciário e da
mídia apontem sempre para um único lado, o certo é que na própria operação
"lava-jato" estão envolvidos políticos do governo e da oposição, com
destaque para Eduardo Cunha), mas o pecado original do PT foi chegar ao poder e
adotar as mesmas práticas que antes combatia.
O PT não
inventou a corrupção, mas aprendeu e gostou. Não inventou o mensalão, mas fez
uso dele. Não inventou a propina, mas começou a recebê-la. Não inventou o
financiamento empresarial de campanha, mas passou a depender dele. Não inventou
as relações promíscuas com as empreiteiras, mas se acostumou a praticá-las. Da
mesma forma que não inventou o ajuste fiscal, mas o praticou. Não inventou o
PMDB, mas se associou a ele. Não inventou as alianças da política com o
fundamentalismo religioso, mas renunciou à agenda de gênero e à liderança na
luta LGBT para acordar com os pastores milionários. Não inventou Cunha, que já
tinha sido arrecadador de Collor e PC Farias, mas se aliou a ele, e depois foi
traído por ele, hoje aliado ao PSDB.
Cada uma
dessas escolhas políticas foram pavimentando o caminho que nos levou à atual
conjuntura: um governo cada vez mais débil, uma crise econômica e um ajuste que
estão acabando com os ganhos sociais do lulismo e um esquema de corrupção que
ameaça envolver até o Lula. Nada disso me faz feliz, muito pelo contrário, mas
são fatos.
É nesse
contexto que hoje assistimos ao show televisivo da "condução
coercitiva" do Lula, tão espetacular quanto desnecessária, já que ele
nunca se negou a colaborar com a justiça. Esses abusos merecem meu repúdio, da
mesma forma que os vazamentos seletivos, a parcialidade de boa parte da
imprensa e a hipocrisia da oposição de direita, que financiou suas campanhas
com o dinheiro das mesmas empreiteiras da lava-jato que financiaram o PT. As
empreiteras pagaram as campanhas de todos eles! Toda essa hipocrisia me
repugna.
Porém, o
que mais me entristece é que os que deveriam ter combatido tudo isso tenham se
adaptado ao sistema e aprendido suas práticas. É triste porque a derrota é de
todos nós, da esquerda, inclusive daqueles que, como eu, nunca militamos no PT.
Graças a tudo isso, os tempos que vêm serão provavelmente sombrios e custará
muito reconstruir uma alternativa política popular e conseguir que a maioria
acredite nela.
Será
difícil, mas é necessário, e eu espero que essa geração não cometa os mesmos
erros.*Jean Wyllis é jornalista, professor universitário e deputado federal.
SOBRE LULA E A LAVA-JATO
Reviewed by Jorge Schalgter Leal
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08:56
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